ESPORTES & EXERCÍCIOS

Fisiologia humana X mecanismos da dor muscular tardia pós-treino

Qual seria a explicação científica do porquê que essa dor ocorre?

Fisiologia humana X mecanismos da dor muscular tardia pós-treino Antigamente, a ocorrência desse tipo de dor era relacionada com o acúmulo de ácido lático muscular.
Crédito: BANCO DE IMAGENS
Podemos dizer que um dos assuntos mais comuns no meio fitness e dos adeptos aos treinos resistidos de musculação, é aquela famosa dorzinha muscular pós-treinamento resistido, também chamada de mialgia, que pode muitas vezes ser um incômodo, principalmente após a mudança periodizada de um ciclo de treino ou depois de longos períodos de ausência às salas de musculação.

A dor muscular pós-treino, pode ser idolatrada por muitos praticantes de musculação, que a percebem como um nítido sinal de que a musculatura foi devidamente recrutada, porém em alguns indivíduos a mesma poderá ser incômoda ou até mesmo incapacitante. Mas, será que realmente precisa existir a dor depois do treino para o estímulo do exercício ser efetivo? 

Cientificamente podemos dizer que essa dor é chamada de Dor Muscular Tardia (DOMS/ sigla em inglês, Delayed Onset of Muscle Soreness) e surge em torno de 8 horas depois da prática da atividade física, podendo muitas vezes, aumentar a intensidade nas próximas 24 a 48 horas e diminuindo progressivamente após 72 horas do treino submetido.

Antigamente, a ocorrência desse tipo de dor era relacionada com o acúmulo de ácido lático muscular, tido como o grande responsável nos mecanismos neurológicos da dor, porém atualmente, já é sabido que o ácido lático acumulado durante a atividade de contração muscular, é completamente removido em aproximadamente uma hora e meia após a atividade, pois existem outros mecanismos fisiológicos homeostáticos (equilíbrio), responsáveis pela neutralização do ácido lático, não sendo este, o grande vilão responsável pela dor muscular. 

Resumidamente, acreditamos que as principais causas da ocorrência da dor estão relacionadas a alguns fatores fisiológicos, sendo o principal ‘carro chefe’ da inflamação muscular tardia, os micros traumas, que são originados pela própria sobrecarga imposta durante a contração muscular do treinamento (concêntrica e excêntrica), porém os maiores, são aqueles originados na execução da fase excêntrica de contração muscular (fase de relaxamento ou fase de retorno do movimento), gerando micro lesões nas fibras musculares.

Os micros traumas, ocorrem quando solicitamos nossos músculos acima de certo limite de tolerância, o que varia demais de um paciente para outro, porém ele é basicamente rotineiro no dia a dia de um praticante de treinamento resistido (musculação). Qualquer tipo de movimento pode ocasionar a dor muscular tardia, mas elas são mais comuns nas contrações do tipo excêntricas, quando o músculo se contrai e se alonga, que é o que ocorre com frequência nos exercícios resistidos de musculação. Esse tipo de movimento leva à micro ruptura de inúmeras fibras musculares e ao aumento de diversas enzimas, originando uma fase inflamatória que antecede a fase de reparação das fibras musculares danificadas.

Bioquimicamente, podemos dizer que os micros traumas funcionam como o início de uma cascata de alterações celulares em estruturas musculares chamadas de miofibrilas, que resultam num processo inflamatório com produção de dor, pois segundo a fisiologia imune endocrinológica, sabemos que a dor faz parte de um dos fatores da inflamação humana, assim como o edema (inchaço), calor, rubor (vermelhidão), etc.

Seguindo essa linha de raciocínio, durante o exercício de intensidade elevada há um grande aumento das enzimas musculares CPK (Creatina Fosfatoquinase) na corrente sanguínea, indicando que houve dano tecidual, sendo que alguns estudos científicos mostram elevadas concentrações de leucócitos, macrófagos e mediadores inflamatórios no músculo. Dessa forma, podemos dizer que a inflamação é a grande responsável pelo sintoma de dor muscular, porém posteriormente será a responsável também pela regeneração muscular. 

Esse processo tem início com a produção de moléculas conhecidas como citocinas, podendo ter ação pro-inflamatória ou anti-inflamatória. As citocinas, são proteínas de baixo peso molecular produzidas por diferentes tipos de células corporais, principalmente células imunes e que agem de maneira autócrina (com atividade na própria célula), parácrina (atividade nas células vizinhas) e endócrina (atividade em regiões distantes, transporte via corrente sanguínea), sendo algumas delas: interleucina-1β (IL-1β), interleucina-6 (IL-6), interleucina-8 (IL-8) fator de necrose tumoral (TNF-α), interferons (IFN), interleucina-2 (IL-2), a interleucina-4 (IL-4), interleucina-10 (IL-10), interleucina-13 (IL-13), receptor antagonista da IL-1 (IL-1ra). 

Trata-se de um trauma microscópico que acomete algumas fibras musculares, levando o organismo sabiamente a desencadear um processo de reparação do ‘estrago’ realizado, que se caracteriza por um processo inflamatório, tendo como sintoma principal a dor (ativação de neurônios noceptores). Como dito anteriormente, essa inflamação muscular poderá gerar além da dor, uma alteração nos mecanismos internos de produção e liberação de cálcio, podendo levar a necroses celulares, além de um processo de edema (inchaço), aumento de temperatura e de volume local, podendo até em casos mais sérios, provocar uma incapacitação funcional.  

Anatomicamente, sabemos que o sintoma de dor e  desconforto são sentidos mais intensamente na junção miotendínea, que é a região membranosa entre o músculo e o tendão, que transmite a força para este. Isso geralmente ocorre, porque o tendão é menos flexível do que o tecido muscular sendo, portanto, mais suscetível a lesões pela contração intensa. 

No entanto, a dor muscular tardia nem sempre ocorre na mesma intensidade em todos os indivíduos, uma vez que mesmo treinando corretamente, o organismo sofre um poderoso processo interno adaptativo, podendo muitas vezes, não gerar sintomas de dor mesmo tendo sido treinado corretamente, graças a famoso processo homeostático (equilíbrio interno).

Dessa forma, podemos concluir que essa condição clínica de dor tardia muscular pós-exercício físico é rotineira no dia a dia de um praticante do treinamento físico, regredindo em pouco tempo (no máximo alguns dias), sem deixar nenhuma sequela, principalmente quando o programa de exercícios é realizado com a supervisão de um profissional qualificado.

Dr. Edson Carlos Z. Rosa

Cirurgião, Fisiologista e Pesquisador em Ciências Médicas, Cirúrgicas e do Esporte

Diretor do Instituto de Medicina e Fisiologia do Esporte e Exercício (Metaboclinic Institute), Diretor Executivo do Centro Nacional de Ciências Cirúrgicas e Medicina Sistêmica (Cenccimes) / Diretor Executivo da União Brasileira de Médicos-Biocientistas (Unimédica) /  Presidente e Fundador da Ordem Nacional dos Cirurgiões Faciais (ONACIFA), Presidente e Fundador da Sociedade Brasileira de Medicina Humana (SOBRAMEH) e Ordem dos Doutores de Medicina do Brasil - ODMB, Doutor em Ciências Médicas e Cirúrgicas (h.c),

Pós-graduado em Clínica Medica - Medicina interna, Medicina e Fisiologia do Esporte/Exercício, Nutrologia e Nutromedicina, Fisiologia Humana Geral aplicada às Ciências da Saúde.

Escritor e Autor de Diversos Artigos na área de Medicina Geral, Medicina e Endocrinologia do Esporte, Cirurgia de Cabeça e Pescoço, Neurociência e Comportamento Humano.

Fundador-Gestor do e-Comitê Mundial de Médicos do Desporto e Exercício (Official World Group of Sports And Exercise Physicians), Fundador-Gestor Internacional de Cirurgiões Craniomaxilofaciais (The Official World Group of Craniomaxilofaciais Surgeons).

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