PALAVRA DO ESPECIALISTA

Artigo - Aspectos clínicos do lipedema e a influência da prática de exercícios físicos

O Linfedema é uma condição médica crônica que afeta o sistema linfático, resultando no acúmulo de fluidos de procedência linfática nos tecidos do corpo humano

Artigo - Aspectos clínicos do lipedema e a influência da prática de exercicíos físicos Crédito: Banco de imagens

Podemos dizer que o Linfedema é caracterizado por um edema (inchaço) persistente, geralmente em membros inferiores, mas também pode afetar outras partes do corpo humano. Dentre as diversas condições que caracterizam um quadro de Linfedema, podemos destacar uma forma específica de linfedema é o Lipedema, onde o mesmo, apresenta um acúmulo de gordura em áreas específicas do corpo, como pernas, coxas e braços. Neste artigo, vamos destacar a intima relação entre o Lipedema, principais características da patologia e a sua influencia com a prática de exercícios físicos. 

LIPEDEMA – DEFINIÇÃO

O lipedema é uma doença crônica, dolorosa e progressiva, que acomete principalmente mulheres e se inicia entre a puberdade e a terceira década de vida. Envolve a deposição anormal de tecido adiposo subcutâneo, levando a um aumento de volume bilateral e desproporcional, principalmente dos membros inferiores. Acredita-se que o Lipedema tenha uma base genética e hormonal, com fatores hormonais envolvidos (hormônios sexuais femininos), além da predisposição genética, que desempenha um papel importante no desenvolvimento da doença. Diante disso, há um aumento simétrico das nádegas, quadris e pernas, e em 80% dos casos essa deposição de gordura acomete braços e geralmente poupa mãos, pés e tronco dos pacientes. Além do aumento de gordura subcutânea, há um aumento da permeabilidade e fragilidade capilar, resultando tanto em extravasamento de líquido quanto facilidade em formar hematomas, já que a presença de dor foi atribuída tanto às forças mecânicas quanto aos efeitos bioquímicos nas fibras nervosas simpáticas, sendo a inflamação protagonista desse cenário.

FISIOPATOLOGIA DO LIPEDEMA – COMO OCORRE NO ORGANISMO

A causa (etiologia) do Lipedema ainda não é totalmente estabelecida, no entanto, há estudos que sugerem a ocorrência de suscetibilidade poligênica associada aos distúrbios hormonais, microvasculares e linfáticos. Células inflamatórias, adipócitos hipertróficos, vasos sanguíneos anormais e disfunção linfática presentes no lipedema estão associados ao dano tecidual e desenvolvimento de uma doença fibrótica. A análise do tecido adiposo (gorduroso) do Lipedema vem constatando a presença de adipócitos hipertróficos, células imunes inflamatórias e dilatação dos vasos sanguíneos e linfáticos subdérmicos. Na literatura encontramos descrições da elevada quantidade de infiltrado de macrófagos, mastócitos e linfócitos T no tecido adiposo do Lipedema, geralmente detectados ao redor dos vasos sanguíneos, o que pode estar associado a maior permeabilidade capilar e acúmulo de líquido intersticial. Outro estudo demostra que o acúmulo de Mastócitos no tecido do Lipedema contribui também para a deterioração dos adipócitos e fragmentação da fibra elástica, devido a liberação de elastes.

Concomitantemente a estes fatos, a interação direta célula-célula entre macrófagos e adipócitos hipertróficos, somado aos fatores parácrinos secretados (hormonais), como por exemplo o fator de crescimento endotelial vascular, que atua como marcador de angiogênese, previamente relatados no sangue de pacientes com Lipedema, podem estar associados com aumento no número de vasos sanguíneos, a dilatação de capilares, inflamação, hipóxia e fibrose tecidual encontrada em portadores do quadro. Além disso, hormônios como estrogênio e progesterona, têm efeito direto na lipogênese (formação de tecido gorduroso) e na distribuição do tecido adiposo no corpo, sendo que a desregulação dos níveis desses hormônios leva à desregulação de tecido adiposo e comprometimento do mecanismo de lipogênese e de lipólise, corroborando com a hipótese de que a doença tenha alguma contribuição de estrogênio em sua fisiopatologia.

ASPECTOS BIOQUÍMICOS E METABÓLICOS DE FORMAÇÃO DO LIPEDEMA

A patogênese do Lipedema envolve uma interação complexa entre adipócitos, células do sistema imunológico, vasos linfáticos e fatores inflamatórios. Estudos sugerem que as células de gordura no lipedema podem ser hiperativas e mais sensíveis aos hormônios femininos, levando a um aumento na acumulação de lipídios e inflamação localizada. Além disso, há evidências de disfunção linfática, incluindo aumento da permeabilidade capilar e estase linfática, o que contribui para o edema crônico observado no lipedema.

A inflamação crônica associada ao Lipedema pode levar à ativação do sistema imunológico e à produção aumentada de citocinas pró-inflamatórias, como o fator de necrose tumoral alfa (TNF- alfa) e interleucinas (IL), contribuindo para o desenvolvimento de fibrose e remodelação do tecido adiposo. Esse processo inflamatório contínuo pode resultar em dor, sensibilidade aumentada e disfunção do tecido conjuntivo nas áreas afetadas.

PRINCIPAIS SINTOMAS DO LIPEDEMA

Entre as queixas mais comuns dos pacientes com Lipedema, incluem-se dor moderada à intensa ao realizar pressão digital nos membros afetados e a maioria sente dor espontânea. O inchaço simétrico dos membros inferiores que termina abruptamente nos tornozelos é um dos sinais cardinais do Lipedema e que pode ser responsável por sensação de peso, fadiga e desconforto nas pernas. O inchaço e a dor pioram durante o clima quente e realização de exercícios, e não são aliviados pela elevação dos membros, sendo que o excesso de peso nas pernas dificulta a mobilidade. É importante ressaltar os problemas emocionais experimentados pelas mulheres com Lipedema, devido ao excesso de peso mal distribuído, incluindo constrangimento, ansiedade e depressão, os quais prejudicam a qualidade de vida como um todo. Alguns pacientes desenvolvem sintomas leves que não progridem, enquanto outros experimentam progressão gradual ou acelerada. Os sintomas podem se intensificar em estágios avançados da doença, e isso pode se associar ao aumento de doenças cardiovasculares e renais. Embora o Lipedema envolva principalmente o acúmulo de gordura, ele também pode levar ao desenvolvimento de linfedema secundário devido à compressão dos vasos linfáticos pelos depósitos de gordura. Isso pode resultar em um ciclo de inflamação crônica, disfunção linfática e aumento do acúmulo de fluido nos tecidos.

TRATAMENTO

O tratamento para o Lipedema é multifatorial e envolve exercícios físicos, dieta, nutrição adequada, suporte emocional e controle de outras causas coexistentes de edema dos membros inferiores. Embora a perda de peso possa não ajudar, a prevenção de ganho de peso excessivo é importante para não dificultar o tratamento. Ainda que as estratégias dietéticas não possam prevenir a distribuição desproporcional de gordura, elas podem reduzir a inflamação local, melhorando assim os sintomas, a saúde e o bem-estar de forma geral. O cuidado da pele é importante para pacientes com Lipedema complicado por linfedema ou insuficiência venosa crônica. A aplicação regular de cremes hidratantes evita o ressecamento da pele, reduzindo assim o risco de infecção, principalmente a celulite. Os principais objetivos do tratamento incluem redução dos sintomas, melhora da limitação funcional e prevenção da progressão da doença.

LIPEDEMA X MEDICINA DO ESPORTE E EXERCÍCIOS FÍSICOS

O tratamento do Lipedema geralmente envolve uma abordagem multidisciplinar, que pode incluir dieta, terapia física, compressão, medicamentos e, em casos avançados, cirurgia. No entanto, os exercícios físicos desempenham um papel fundamental no manejo do Lipedema, ajudando a melhorar a circulação, reduzir o acúmulo de gordura e promover a saúde geral. Os exercícios físicos recomendados para pessoas com Lipedema devem ser adaptados às suas necessidades individuais e limitações.

Exercícios de baixo impacto, como caminhada, natação, hidroginástica e ciclismo, são geralmente bem tolerados e podem ajudar a melhorar a circulação e a mobilidade das articulações. Além disso, exercícios de fortalecimento muscular, especialmente para os músculos das pernas e dos braços, podem ajudar a melhorar o tônus muscular e a estabilidade das articulações, reduzindo assim o risco de lesões e melhorando a capacidade funcional.

É importante que as pessoas com Lipedema evitem exercícios de alto impacto e atividades que possam sobrecarregar as articulações, como corrida ou saltos, pois isso pode piorar os sintomas e causar lesões. Em vez disso, é recomendável optar por atividades mais suaves e de baixo impacto, que ofereçam benefícios sem causar danos adicionais. Além do exercício físico regular, é importante manter um peso saudável, seguir uma dieta equilibrada e usar roupas de compressão conforme necessário para ajudar a controlar os sintomas do Lipedema.

Em resumo, os exercícios físicos desempenham um papel importante no manejo do Lipedema, ajudando a melhorar a circulação, reduzir o acúmulo de gordura e promover a saúde geral. No entanto, é crucial adaptar os exercícios às necessidades individuais e limitações de cada pessoa e evitar atividades que possam causar danos adicionais. Podemos dizer que uma abordagem multidisciplinar e um plano de tratamento personalizado, é possível gerenciar eficazmente os sintomas do Lipedema e melhorar a qualidade de vida dos pacientes portadores do quadro.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Lipedema é uma condição crônica caracterizada pelo acúmulo anormal de tecido adiposo, resultando em uma distribuição desproporcional de gordura, geralmente afetando as extremidades inferiores, mas também pode ocorrer em outras partes do corpo. Embora a etiologia exata do lipedema ainda não seja completamente compreendida, fatores genéticos, hormonais e metabólicos desempenham um papel importante no seu desenvolvimento. Além disso, o lipedema pode aumentar o risco de desenvolvimento de Linfedema Secundário devido à compressão dos vasos linfáticos pelos depósitos de gordura, resultando em um ciclo vicioso de inflamação crônica, estase linfática e acúmulo de fluido intersticial nos tecidos. O diagnóstico precoce e o tratamento adequado são essenciais para ajudar a controlar os sintomas, prevenir complicações e melhorar a qualidade de vida dos pacientes com Lipedema. Como já mencionado acima, se torna essencial a adoção de uma abordagem multidisciplinar no manejo do Lipedema, pois o tratamento do quadro, geralmente inclui uma combinação de terapia física, dieta, exercícios, uso de roupas de compressão, medicamentos e, em casos selecionados, procedimentos cirúrgicos. Para finalizar esse artigo, destaco a importância de educar os pacientes sobre a natureza crônica do Lipedema, promovendo a conscientização sobre a condição e oferecendo apoio emocional e psicológico para ajudar os pacientes a lidar com os desafios físicos e emocionais associados a condição, pois com uma abordagem abrangente e personalizada, é possível gerenciar eficazmente os sintomas do Lipedema, melhorando a qualidade de vida de nossos pacientes afetados por essa temida condição.

Dr. Edson Carlos Z. Rosa

Cirurgião, Fisiologista e Pesquisador em Ciências Médicas, Cirúrgicas e do Esporte

Diretor do Instituto de Medicina e Fisiologia do Esporte e Exercício (Metaboclinic Institute), Diretor Executivo do Centro Nacional de Ciências Cirúrgicas e Medicina Sistêmica (Cenccimes) / Diretor Executivo da União Brasileira de Médicos-Biocientistas (Unimédica) /  Presidente e Fundador da Ordem Nacional dos Cirurgiões Faciais (ONACIFA), Presidente e Fundador da Sociedade Brasileira de Medicina Humana (SOBRAMEH) e Ordem dos Doutores de Medicina do Brasil - ODMB, Doutor em Ciências Médicas e Cirúrgicas (h.c),

Pós-graduado em Clínica Medica - Medicina interna, Medicina e Fisiologia do Esporte/Exercício, Nutrologia e Nutromedicina, Fisiologia Humana Geral aplicada às Ciências da Saúde.

Escritor e Autor de Diversos Artigos na área de Medicina Geral, Medicina e Endocrinologia do Esporte, Cirurgia de Cabeça e Pescoço, Neurociência e Comportamento Humano.

Fundador-Gestor do e-Comitê Mundial de Médicos do Desporto e Exercício (Official World Group of Sports And Exercise Physicians), Fundador-Gestor Internacional de Cirurgiões Craniomaxilofaciais (The Official World Group of Craniomaxilofaciais Surgeons).

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