SAÚDE E SUPLEMENTAÇÃO INFANTIL

Opinião: O que pode e não pode na primeira infância?

Cuidados na primeira infância pela abordagem Pickler

Opinião: O que pode e não pode na primeira infância? O 1º estágio de vida é considerado pela neurociência, como o período de mais plasticidade neural no desenvolvimento humano
Crédito: BANCO DE IMAGENS
Por
Profª. Andreia Cristine Pacheco
Profª. Mônica Carniel Marques

Atualmente, muito se tem buscado sobre temas relacionados aos cuidados com a criança na primeira infância, fase que vai do nascimento até os seis anos. Este período tão importante no desenvolvimento infantil aparece cada vez mais nas mídias sociais, e faz com que pais e professores voltem ainda mais seus olhares a ele. Permitir que a criança se desenvolva em seu próprio ritmo, um dos assuntos que têm aparecido nos meios digitais, é um dos princípios da abordagem Pikler, criada pela médica húngara Emmi Pikler. O método se apoia em pilares que valorizam a atividade autônoma da criança, em momentos fundamentais da educação infantil.
A abordagem Pickler provoca uma série de inquietações pois, em geral, nossa cultura tem uma visão diferente sobre como tratar as crianças.  Em seus estudos, a médica observou, por exemplo, que crianças que corriam pelas ruas, subiam em árvores e brincavam livremente tinham menos acidentes do que aquelas que viviam em ambientes superprotegidos, com regras e repletos de ‘não pode’. Com isso, ela concluiu que crianças que brincavam livremente são mais prudentes e sofrem menos acidentes do que as que são cheias de restrições e que, devido às limitações motoras, se machucam com mais facilidade.
Apareceu então a seguinte pergunta na mente pensante de Emmi Pikler: até que ponto é necessária a intervenção dos adultos no desenvolvimento motor infantil? A médica pôde confirmar as suas observações depois de assumir a direção de uma instituição para crianças órfãs, criada por ela em 1946. O instituto Lóczy se tornou uma referência, pois com a metodologia Pickler, as crianças mostraram-se emocionalmente seguras, tranquilas e com um ótimo desenvolvimento motor.
O primeiro estágio de vida é considerado, segundo a neurociência, o período de mais plasticidade neural no desenvolvimento humano. Essa é a fase que representa a maior capacidade do sistema nervoso de mudar ou de se adaptar, assim como de estar exposto a diferentes experiências ou novos estímulos. Depois, a pessoa não terá mais a mesma capacidade de aprendizagem. Por isso, é extremamente importante investir em uma educação de qualidade na primeira infância, que tenha como prioridade o ensino e o cuidado.
De acordo com as pesquisas de Emmi, os bebês mudam de posição uma vez por minuto. Eles têm um impulso natural para se movimentarem e assim, mesmo de forma desordenada (sem controle dos movimentos), vão tomando posse do seu tônus muscular, permitindo o desenvolvimento de novas habilidades motoras. Quando se move, o bebê está conhecendo seu corpo e descobrindo suas capacidades e possibilidades. De acordo com Emmi, “a criança que chega a algo por seus próprios meios adquire mais conhecimentos de outra natureza do que aquela que recebe a solução totalmente elaborada”.
Assim, os sete primeiros anos da nossa vida são importantíssimos e requerem atenção especialmente em quatro sentidos considerados básicos, que nos informam sobre nosso corpo, nossos limites, nosso equilíbrio e o que é vital para a nossa sobrevivência. São eles:

O sentido do tato, que nos proporciona os limites do ‘eu’, o entendimento do nosso corpo, como também a percepção do outro. O tato também desenvolve a segurança e a confiança. Por isso, desde pequeno o bebê precisa ser tocado e acariciado e ter a oportunidade de manipular objetos. Com isso, diminuem as chances de ele apresentar dificuldades de relacionamentos e medos no futuro.
Já o sentido do movimento nos faz aprender sobre nosso corpo e nossos movimentos, nos ajudando a tomar posse do que é nosso. Neste sentido, é importante perceber os movimentos musculares e quais se movem de acordo com meus desejos e minhas vontades. Esse sentido nos revela a sensação de liberdade, nos permite sentir alegria e acolhimento. Sem o movimento, a criança pode ter problemas de linguagem, tristeza, dificuldades no aprendizado e até mesmo depressão. E muitas vezes não deixamos as crianças se movimentarem como necessitam, com receio de elas se machucarem.
Tão importante quanto o sentido do movimento é o do equilíbrio, que nos revela a relação do nosso corpo com o espaço, ou seja, se estamos localizados à direita, à esquerda, em cima ou embaixo. O equilíbrio nos traz autonomia e calma e a falta dele pode provocar dislexia, disgrafia e até mesmo discalculia. O quarto, e não menos importante, é o sentido vital. Este nos mostra qualquer sinal de alteração no corpo e no organismo, nos faz perceber quando estamos com fome, sono e dor. Sem ele, teremos dificuldade de perceber até mesmo a dor do outro.
Emmi Pikler dizia que “toda criança é boa e competente”. Desta forma, basta olharmos para esse pequeno ser que nos é confiado acreditando que ele pode, e deve, se desenvolver naturalmente e individualmente. Isso significa valorizar todas as qualidades possíveis, percebendo que o seu tempo de criança é diferente do tempo de nós, adultos. Para finalizar, uma frase potente da pediatra e ex-diretora do Instituto Pikler, Judit Falk: “Não se pode prometer mais do que se pode dar, mas o que se dá deve ser estável e seguro”.

Fonte: Mônica Carniel Marques é professora de Música no Colégio Marista de Maringá (PR). Andreia Cristine Pacheco é professora no Colégio Marista de Maringá (PR).

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